Porque assim me demorei na contemplação da vida
foi ela passando de raspão,
mansa e fugidia,
sem que minhas mãos a pudessem agarrar.
Desta distancia a que agora a olho,
sabendo que a deixei fugir-me da mão,
ainda assim o não lamento,
porque a vida me brindou, apesar de tudo,
com o mais belo dos presentes
que eu adoro e reclamo como a maior vitória
de um alheamento que o não foi.
Apenas queria ver a vida,
só queria compreendê-la, senti-la,
nos mais recônditos momentos,
nas alegrias e tristezas,
somente a vida,
em todo o esplendor que podia conceder-me.
À minha frente uma torre,
alta mas já não altaneira,
forte nas suas paredes de pedra,
larga e compacta.
Talvez equivalente a quatro ou cinco andares actuais,
no seu tempo uma terrível defesa de território.
Era menos gente, mas por certo,
bem pouco exigente também,
para se amortalhar por trás destes pedregulhos,
com um tão pequeno espaço e limitada acção.
Que vida teriam estes senhores?
Esta família Andrade, mais precisamente os condes de Vilalba.
Bem a norte de Espanha.
Viviam sem dúvida em terras medievais,
que grassaram por toda esta Europa.
Horizontes limitados, gente atrofiada do medo desconhecido,
empedrados em vida.
A traição dói!
Maior é a dor quando vem,
sem que se espere,
de quem não o devia fazer.
Na amizade traída,
ferida no seu íntimo,
perdoas e retrais-te,
mas nunca mais a esquecerás.
Uma gota, duas gotas,
uma enxurrada,
não para e cai,
impiedosa,
molha-me e encharca-me,
sinto-a penetrar-me,
pela pele, pelos poros,
ágil e rápida,
até aos ossos,
para além deles.
Incomoda,
agrava-me o humor,
inunda e arrasa,
mas sem ela correr,
para a vida,
não haverá sobrevivência.
Na memória mora o esquecimento,
de tudo o que me desagradou.
Relembro os bons momentos,
esqueço os maus e perdoo
aos que mal me fizeram.
Estranham que assim seja,
eu sei que não estão habituados,
preferem uma vida de vinganças,
uma vida de ressentimentos.
Mas eu sou assim,
de tudo o que acabo e esqueço,
faço um novo começo e acredito,
que em cada um,
haverá sempre uma atitude diferente.
Crio e creio num mundo em que acabará por existir,
sem mágoas e sem ódios,
uma humanidade diferente,
uma humanidade com o coração presente.
Porque a diferença de idade não era importante,
e dez anos não significavam nada,
nesta diferença que nos completava.
Uma diferença que me dava a capacidade,
de navegar em teu corpo,
como sempre sonhaste que o deviam fazer,
uma diferença que me empurrava para a paciência,
de te conhecer sem nunca te ter conhecido,
uma diferença que fazia a diferença.
Senti-te feliz,
conheceste a diferença da diferença,
e eu conheci-te como mulher.
Saiam aos pares, sozinhos,
todos tinham uma característica comum,
vinham de cabeça baixa.
Pensando, talvez, em como uma papelinho,
coisa aí para uma medida de 15x10,
cheio de garatujas, siglas diversas,
poderia vir a mudar a sua vida,
ou talvez não!
Cumpriram a sua obrigação, exerceram o seu dever.
E com isso não se sentiam felizes,
de ter conferido à ocasião,
a solenidade e alegria de outros tempos.
Vinham tristes, rostos fechados,
sabendo, bem no fundo do coração,
que nada mudaria, que tudo seria igual,
e afinal o papelinho pomposo,
não era mais que uma nova forma,
rebuscada e engalanada,
de os enganar de trair os seus sonhos.
Não se muda nem se altera,
por ser assim…
Tudo se permanece imutável e,
por ser assim…
Tudo será diferente,
porque então,
por ser assim…
nada se alterou e,
mesmo assim e,
por ser assim…
Num repente,
tudo mudou e tudo se alterou e,
por ser assim…
tudo se modificou,
de repente, contra a corrente, e só,
por ser assim…
Tão imutável,
tudo se mudou.
Passou alto o suficiente para se sentir em segurança,
e na cauda deixou um intransponível muro,
que se elevou da terra quente e verde,
um inferno como representação não lhe ficava mal,
nas copas das árvores da mata verde e cerrada,
surgiram as labaredas em contínuo elevar,
a céus que não as protegiam,
e desta vez, uma das várias em que aconteceu,
não se sentiu no ar puro de selva,
o característico cheiro a carne queimada.
Afinal, era só uma desmatação.
Afinal como se conta o tempo?
E que tempo é necessário?
Para tudo o que precisa de tempo?
Eu tinha tempo e já nem sei se ainda o tenho!
É que nos muitos anos ao serviço de uma empresa,
das grandes, daquelas que têm muita gente mesmo,
como se conseguem conhecer todos os colegas?
Não sei, na verdade não o consegui,
nunca os conheci e provavelmente nunca os conhecerei todos.
E neste almoço em que tive o privilégio de estar presente,
muitos foram os que não conhecia,
outros de quem me lembrava das caras,
muito poucos os que conhecia realmente.
Afinal quanto tempo é preciso?
Quanto dele é necessário para nos conhecer-mos todos?
E porque não o forçamos para que isso aconteça?
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