Quando olhamos e pensamos
que atingimos um nível civilizacional
que nos retira das cavernas da ignorância,
para nos sentirmos em comunidade seguros e solidários,
pelas leis, pelas regras e códigos de ética,
vem o ciclo de vida, que não pára,
que recomeça a cada fim de ciclo,
que esquece e faz esquecer,
arrebata até o bom senso
sobre tudo o que foi conquistado.
Arremete-se contra a ordem,
cria-se a desordem,
espalha-se a discórdia,
diminuem-se as características
que de nós fazem um povo,
uma Nação com gente dentro,
cujos princípios são universais
e a todos aplicados por igual.
Porque o ciclo deu a volta
e a memória foi substituída,
por um simples cartão de memória,
que nos dá acesso
a uma qualquer plataforma digital.
Satisfeitos ficamos já
com o menear do dedo
sobre um distinto ecrã,
enquanto à nossa volta se fecha
mais um ciclo que se repete
e renova no retrocesso do esquecimento.
Dança-se e desvanece-se no balançar dos corpos,
dança-se porque nos embalamos no sonho
que a música que nos envolve eleva,
dança-se.
Eu danço quando vos vejo a dançar
perante meus olhos cansados,
eu danço também no sorriso dos vossos olhos
e olho-vos com turvo olhar
onde a lágrima teimosa insiste em bailar também.
Danço-vos no coração que vos ama,
sigo cada gesto, cada movimento,
e danço convosco,
mesmo sem dançar.
Hoje acordei,
já é bom acordar para um novo dia, mas hoje,
o acordar vem com sabor especial,
uma pitada de cinzento no céu,
um sabor a sal na boca,
uma garganta seca e um tremor na barriga.
Hoje acordei,
satisfeito, por um lado, temeroso por outro,
não sei como vai acabar o dia,
como não sei como acabam todos os outros.
Hoje acordei,
com aquela sensação de bem-estar,
à mistura com um receio do que vou enfrentar, pessoas,
sempre me criaram algum receio,
porque podem gostar ou não do que faço,
porque não posso estar nervoso para lhes agradecer,
toda a atenção que não mereço,
mas tenho de reconhecer todo o carinho que me dispensam.
Imortalizou-se na praça,
comemorou batalhas
e vitórias,
que as derrotas,
pouco deixaram para a festa.
Ainda assim,
a cruz lá estava,
imponente, imóvel,
cobrindo a praça com a sombra que o sol,
na sua cósmica força,
impunha debaixo dos seus raios.
Ali comemorava os dias da alegria,
ali lembrava a tristeza de outros dias,
mas da altura da sua importância,
a cruz ali estava,
lembrando ao povo crente
que dali também nascera Portugal.
Esquivas-te pelas esquinas da vida,
nas ruas que percorremos
procuras os vãos que te acoitam,
e passas despercebido,
aos olhos que não querem encontrar-te.
No deambular pela cidade,
quase não dão por ti,
mas estás lá,
em cada esquina da vida,
em cada esquina da cidade,
em todas as esquinas,
que a vida madrasta te oferece.
Não vêm, porque não querem,
assusta-os poisar o olhar em ti,
horroriza-os saber que são cada vez mais,
que podem vir a ser um deles,
e desviam o olhar pensando que,
assim se afastam do flagelo.
Se soubesses o efeito que tens,
se imaginasses o que acontece
quando sem esperar apareces do nada.
Se sentisses o que eu sinto,
quando assim te vislumbro
e meu coração acelera um pouco.
Se eu soubesse o que isto é,
amor não será certamente
que a idade já não consegue discerni-lo.
Se tivesses o mesmo ensejo,
que este corpo apresenta
quando o teu está por perto.
Se ambos pudéssemos andar até ao sol,
sempre que o corpo pede uma sombra
e nos desnudássemos de mundanidades.
Se nos enchêssemos do prazer,
sempre que nossos corpos o desejassem
e perdêssemos o pudor de infringir as regras
desta vida que nos tolhe os movimentos.
Se conseguíssemos a quebra dos votos,
que parecem, mas não são imutáveis
e partíssemos à desfilada por este vale da vida
e sentíssemos na pele o apelo,
nú e crú dos desejos contidos e não revelados.
Se ao menos quisesses,
tanto quanto eu o desejo
e prisioneiro das minhas dúvidas não to revelo
mas retenho em imaginações e insónias,
as mil e uma noites de pecado sonhados.
Se ao menos quiséssemos.
Não vejo bem,
alguma coisa está a falhar,
limpo os óculos,
volto a colocá-los,
continuo sem ver claramente.
Procuro a falha,
esfrego os olhos,
retiro a mão húmida.
Afinal era uma lágrima,
de tristeza pelo mundo.
É isto, andar por aí,
dar umas voltas na cidade,
conhecer os becos desconhecidos,
porque uma vida que aqui se viva,
não chega para os conhecer todos.
A dinâmica que a cidade imprime,
às suas ruas e ruelas escondidas,
garante-nos, em cada nova visita,
toda uma diversidade desconhecida.
Na Mouraria, quem diria,
verdadeiramente assim agora descrita,
desta forma prazenteira,
dos primeiros de outrora,
poucos serão os que já não o são.
Este País é um mundo e vai crescendo,
porque este mundo não se confina,
ao mundo que conhecemos e cresce,
com o crescimento do mundo.
Matei a saudade,
desferi-lhe o golpe de misericórdia,
aniquilei-a de vez.
Não voltei,
não sei se um dia voltarei,
o que sei é que não se deve retornar,
não se deve voltar à casa
de onde nos mandaram embora.
Destas margens onde me sento
contemplo as águas,
outrora navegadas,
sulcadas de prazeres mil,
em cada pequena onda
revejo o balancear das velas brancas,
onde embalava o coração.
Em cada descida até à foz,
a excitação do encontro
com as grandes ondas,
do mar pleno e aberto,
onde a adrenalina atingia o zénite.
Em cada subida deste rio,
que enche e encanta esta cidade,
nos dias prolongados de um verão
em que a noite se ia anunciando
pelo lento deitar do sol,
a emoção plena do sentir pela popa
o calor dos últimos raios do astro rei
e as incríveis cores do pôr do sol,
ali ao fundo do rio e à entrada,
desta linda e maravilhosa cidade de Lisboa.
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