No meu estado impuro do amor,
sobrepõe-se o desejo irrequieto,
da tua pura alma sobressai
o simples desejo do amor.
Nesse sentimento te valorizas,
nele me subestimo no conceito
que transformo em impureza
na minha alma adulterada
pelo mais premente desejo carnal de pura lascívia,
que se aquietará pela resposta que em teu corpo se encerra.
Da tua pureza me imbuo e com ela, sem delongas,
me desenhas a alma,
transformando a pura carnalidade,
animalesca e de ousadia duvidosa,
em sensações de absoluta leveza de alma,
e então sobressai o amor,
que se dá em todo o seu esplendor.
E porque estou longe
vos sinto assim tão perto
no bater do meu coração.
A saudade esbate-se,
numa imagem pensada,
que vos traz para tão perto
e sinto-vos junto a mim,
mesmo estando tão longe.
São os mimos e as carícias,
os beijos e abraços sentidos,
que corações tão pequenos
nos deixam encadeados,
no amor que vos tenho,
na saudade que vos sinto
e no carinho que meu peito
abriga sem reservas.
Se porventura um dia
me deres o mar que há em ti,
que dia será esse em que
as águas se misturarão e,
como uma só,
se levantarão em autêntico temporal.
Se porventura um dia tiver o privilégio
de sentir as ondas que há em ti,
não sei se conseguirei ser o nadador
que o teu oceano anseia e espera.
Objectos pessoais,
se assim se podia chamar àquele amontoado de coisas.
Já tinham sido objectos pessoais de alguém,
agora eram só objectos de utilização indispensáveis,
para quem nada mais tinha.
Pouco lhe importava que fossem em segunda,
em terceira ou quadragésima mão.
Serviam-lhe para o que deles necessitava,
exigia-lhes mesmo que ainda prestassem algum serviço,
como objectos que eram nada mais deles esperava,
senão que lhe suportassem a vida,
num momento em que o desespero dela tomava conta.
Se eu fosse peixe, nadava,
se fosse uma ave, voava,
mas eu sou humano,
nem barbatanas nem asas
podem vir em meu auxílio,
nenhuma destas me ajudará a locomover.
Outras capacidades terei,
duas pernas pelo menos,
permitem que me mova,
mas tenho algo mais,
muito mais importante que tudo o resto,
sou capaz de pensar, imaginar, sonhar.
Juntando estas possibilidades todas,
consigo nadar pelas profundezas dos oceanos,
atinjo velocidades espantosas pelos céus do planeta,
e tudo isto pela minha capacidade de imaginar e,
sonhando, visito o mundo.
Enrolada no roupão olhou-se ao espelho,
verificou que aquela pequena ruga,
que começara a despontar,
mais parecia um pé de avestruz.
Desligou-se da imagem,
que só um espelho antipático devolveria,
atrevendo-se a mostrar-lhe que a idade,
não se comprazendo com a eternidade,
começava a aparecer-lhe,
exactamente pelas pequenas rugas na face.
Pensou para si, que não, não se ia esconder,
afinal e apesar delas,
quanta beleza poderiam contar.
Vivias na sumptuosa corte,
escolheste o rei coroado,
não te admires, portanto,
se o escravo te esqueceu.
Olho para lá,
muito para além do universo,
passo as estrelas e os planetas,
acontece-me,
sempre que me sinto só,
sempre que estou longe,
olho para além de mim próprio,
deixo de ver o mundo.
De onde estou,
olho para ELE,
sinto no coração o sorriso da bondade,
de quem gostaria de tirar os pecados ao mundo.
Sinto-me acompanhado.
É tarde, quero dormir,
a noite segue o seu caminho,
procuro segui-la e quero dormir,
mas não consigo.
A mesma noite que me propõe o sono reparador,
retira-me a capacidade de descansar,
levanto-me de tempos a tempos,
para tentar dormir de seguida,
ainda que seja de pé, mas nada.
A noite não é minha amiga,
castiga-me por ser tardio no dormir,
e quando o tento, acorda-me.
É tarde, quero dormir,
olho as estrelas, desenho a lua num céu escurecido,
mas nem elas me ajudam, não consigo,
mas vou tentar de novo.
“Uma moedinha”,
ouço repicar a meus ouvidos,
“para uma sandes”,
diz a voz do outro lado da cabeça.
Levanto os olhos,
através dos andrajosos vestires,
reconheço a necessidade,
não sei se é para a sandes,
não me interessa para que fim,
sei que não posso resistir,
a tão intenso olhar.
Do bolso a retiro,
na sua mão a deposito,
com receio que se perca,
de imediato cerra o punho.
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