Não se lembram, e recomeçam,
repetem a repetição que se repete,
por tempos infinitos se renovam,
e são mais inteligentes e pensadores,
muito mais educados no conhecimento,
que em verdadeira educação,
muitas falhas apresentam.
Mas como autómatos automáticos,
sem o conhecimento dos humanos,
assim repetem o que se repete repetidamente,
e não entendem nem percebem,
que o erro que repisam à exaustão,
irá levá-los ao abismo de uma sociedade,
que de tanto sentir a repetição,
acaba por se repetir também.
São guerras e revoluções, são defesas e ataques,
que um homem não é de ferro e também se cansa,
e se pensa, não é autómato e reage,
e a tanta repetição, acaba por se repetir.
Para a frente o poente,
que o que ficou atrás,
lá muito longe na caminhada,
foi um nascente de esperanças.
Bem olho à volta,
bem gostava de vos dizer,
bem queria orientar-vos,
mas não consigo.
É que noto que não há diferenças,
são todos iguais,
todos vendem um peixe que já fede,
e mesmo assim insistem,
tentam enganar-nos,
levar-nos à certa.
Comigo não contem,
não lhes darei esse prazer,
muito menos lhes darei o voto,
antes rasgá-lo, estropiá-lo, anulá-lo,
mas o voto? O que conta?
Esse não, não o darei,
porque não o merecem.
O que vos diga? Nem sei.
Deambulas pela multidão,
alegre e sorridente,
com a esperança no olhar
de quem espera o futuro
que em Abril renasceu,
do horizonte que desfrutas,
em teu olhar vislumbro
a incerteza do porvir,
que um passado escreveu.
E sonhas, sorris à esperança
que não pode soçobrar
às portas do castelo
que com amor construíste.
No teu sorriso vi o mundo,
pintalgado do vermelho,
que no cravo o teu sangue pintou,
na alma descobri-te,
com o sonho que Abril plantou,
e no corpo senti-te,
o sinete que o tempo em ti fixou.
São sonhos, são futuros,
são cravos vermelhos,
que teimam em não murchar.
Era Abril e os cravos vermelhos,
era primavera e não só na natureza,
era esperança que depressa esmoreceu,
era a liberdade que acabamos por perder,
era o sonho que foi morrendo ao longo da caminhada.
Porque hoje a prisão é o dinheiro,
porque hoje o sonho é um pesadelo,
porque hoje também é primavera na natureza,
porque hoje estão murchos os cravos da nossa primavera.
E se eu gosto de comer,
sentir o sabor de cada porçãozinha,
que cuidadosamente coloco na boca,
a textura, a maciez, o sabor a terra ou a mar.
Está picante? Então é bom, faz bem ao coração,
dizem as línguas que soltas pelo vinho,
me aconselham comummente a usá-lo,
esquecendo que desde pequenino o faço com prazer,
agora ainda lhe acrescento a pimenta,
que é uma homenagem aos navegadores,
que em tempos que já lá vão,
na memória do esquecimento mergulhados,
passaram as passinhas do Algarve para no-la trazerem,
e eu, guloso e prazenteiro, aplico-a em doses generosas.
Mas a comida só sabe realmente bem,
quando em boa companhia,
fazendo escorrer em simultâneo,
o néctar que alegra a gula,
e a palavra que engrandece a alma.
Agiganta-se neste frágil País uma pobreza,
que ao envolver este povo se torna abjecta,
porque não cai do céu,
porque é originada pela mão do homem,
mais grave que tudo isso,
porque vem de quem por ele deveria lutar,
mas optando pelo mais fácil,
retira vida aos seus e condena-os à fome,
e a morte que deles se avizinha,
só tem um nome, pobreza,
pobreza de espíritos que não sabem governar,
uma Nação que merecia mais.
Ali estava, num lugar especial,
sentado de frente para o mar,
na varanda de sua casa,
sua, porque a construiu ele,
com restos de outras casas,
com bocados de outras vidas,
mas esta era a sua e virada para o mar.
Acordava com o sol a entrar-lhe pela janela,
deitava-se com a luz que o luar,
sempre prazenteiro e sem receber nada em troca,
lhe depositava no que ele chamava os seus aposentos.
Não fora aquela inclinação agreste,
aquela estreita faixa de terra tão mal escorada,
que de varanda lhe servia
e seria perfeita,
mesmo sem água corrente,
mesmo sem electricidade,
ainda assim era a sua casa.
E um dia chegaram uns senhores,
que não podia ser, que era impróprio,
ter uma casa na encosta,
virada ao mar e com uma vista destas,
nem sequer estava legalizada,
não pagava impostos nem água, nem luz.
Foi despejado, arrasada a casa.
No seu lugar, já com outras mordomias,
nasceu um condomínio privado,
onde pagavam tudo o que se exigia
nas sociedades modernas e bem-comportadas,
e ele trabalhou na sua construção.
Mesmo ali, onde era a sua casa,
virada ao mar, sem luz, sem água.
Ao fim do dia regressava à nova casa,
no vão de um viaduto,
por onde passavam diariamente,
todos os que iriam viver no nove condomínio.
Entre o ser e o ter vai alguma distância,
e sou, mas não tenho,
e caminho nesta vereda verde,
que me leva a uma estreita passagem,
tão curta que a tenho de cruzar de lado.
Vai-se apertando,
fazendo sentir na carne a sua estreiteza,
tolhendo futuros risonhos,
glorificando amanhãs incertos,
reduzindo-nos ao pó que nos há-de,
com ventos favoráveis,
espalhar nessa passagem mais lata do universo.
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