O que se sente quando uma folha cai?
Nada de especial dirão, secou e caiu.
Uma folha cai porque seca,
porque já não se suporta junto à árvore que a viu nascer.
Pois imaginemos a coisa,
Será que a folha cai por cansaço?
Pois sim, cansaço!
É que isto de passar uma vida pendurado cansa mesmo.
E quando nos cansamos, como as folhas,
definhamos, secamos e,
finalmente, desprendemo-nos da vida,
como as folhas se desprendem,
dos frondosos ramos das árvores.
De longe soprava uma brisa calma,
fresca e acolhedora que cobria o calor do dia,
por entre os sopros sentia o perfume atordoador
com que me envolvias no abraço do desejo.
Sentia-te ao longe, sentia-te longe,
mas o sentir do amor,
desperto pelo perfume de teu corpo
inalava-o pelo sopro da brisa da tarde.
Sempre foi tua a iniciativa,
que eu tímido e amedrontado,
nunca fui capaz de a ter.
E assim foi que,
também a tomaste quando,
quase sem me aperceber,
também me tomaste para ti.
No ponto mais elevado da aldeia,
a construção mais alta das que a rodeiam,
a torre da igreja,
e no cimo o sino,
que toca, repica e marca as horas.
Chama os crentes, avisa-os, informa-os.
Toca e retoca, repica de dia,
silencia-se à noite,
para retomar os seus sons
mal a noite abre os olhos
e a madrugada anuncia o novo dia.
Toca e repica,
o sino da aldeia,
que pelos seus sons,
se transforma no jornal informativo.
Toca e repica.
Se te vejo ao longe e não te fujo,
se me aproximo e te sorrio,
se me sorris também,
é certo e seguro que
um abraço se seguirá,
apertadinho, delicioso e sentido,
quem sabe onde nos levará?
De frente, impiedoso,
bate-me o vento e fecha-me os olhos.
Não quero, não os posso ter fechados,
que estes olhos vêm o que não querem,
mas vêm o que devem ver.
Quero-os abertos,
esbugalhados mesmo, se for o caso,
mesmo que o vento me bata de frente impiedoso,
porque estes olhos,
são o testemunho do que vejo e não quero ver,
mas são também o testemunho do que devem ver.
Para memória futura,
para memória presente,
para memória do que já é passado,
mas sempre como testemunho presente,
da indignidade humana que,
nos abate, amesquinha, diminui e volatiliza,
na vida que nos tiram.
Testemunhas vivas que não se podem fechar,
a vento nenhum que o queira.
Olhas-me com a aspereza que só o teu olhar furibundo,
consegue em mim depositar temor.
E porquê? Porquê, pergunto-te.
E a resposta célere como um cometa,
arremetendo em minha direcção,
atinge-me e acocora-me de tristeza.
Não gosto de piropos!
E porque não se nem sequer te disse nada ofensivo?
Limitei-me a ser eu,
aquele que tem dentro de si a beleza e a poesia e que,
por vezes não consegue contê-la.
Transbordo do meu silencioso interior,
e desdobro-me em prazeres de olhares sorridentes,
no fundo, das minhas palavras nem se intui um piropo,
foi tão somente uma constatação.
E o que afirmei e constato de novo,
é que a beleza assenta em ti como a primavera nas andorinhas,
és bonita, limitei-me a confirmá-lo.
Não penses que te engano,
seria a última coisa que faria,
garanto que quando me entrego,
é por inteiro,
sem desvios ou outros devaneios.
E será bom,
excelente mesmo,
enquanto perdurar e depois,
bem, depois, outros caminhos se trilharão.
Serenos no olhar da vida,
aos cantos a marca
dos anos que se foram,
das agruras suportadas,
de alguma felicidade passada,
e as estrias que os ornamentavam,
eram símbolos de uma riqueza vivida,
de olhares múltiplos sobre a vida e o mundo,
o testemunho de uma mulher
sábia na sua singeleza
que nos deixava enamorados.
As crianças cresceram,
fizeram-se homens.
Os homens envelheceram,
mataram a criança que neles residia.
E a esperança que nas primeiras vivia
foi morrendo na caminhada da vida.
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